terça-feira, 25 de agosto de 2009

Faxineiro não é servente, senhor!

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e de repente, eis que me aparece, pessoalmente, o senhor digno de ser chamado pelo nome, senhor Adauto Lima. Quando eu era criança (este trecho, um clichê da literatura brasileira), o Adauto era faxineiro do meu prédio, ali na Muda. O povo dizia, e até eu achava mesmo, que ele era fedorento. Uns diziam que ele tinha cheiro de peido, outros, de cera de ouvido, outros, de cachorro melado, outros, de, enfim, Comlurb, essas coisas. Então. Ele era legal. Às vezes ele jogava bola com a gente, e às vezes "zunia" a bola. No outro prédio. O Adauto sempre andava de uniforme de cor azul ou cinza, não me lembro tão bem, mais caindo para o cinza. Ele usava um moustache, ou seja, um bigode, que dava a ele um toque de elegância e masculinidade. Masculinidade esta que, quando ele falava, ia para o espaço. Sua voz era muito fina, ou seja, muito aguda, musicalmente falando. E era anasalada, como se (explicando) alguém espremesse as cavidades nasais, ou seja, o nariz, até que não pudesse mais passar ar por dentro e/ou através delas. Adauto era um cara que dividia um apartamento com um porteiro. Ele andava de sandálias Havaianas, que, agora é moda, mas antigamente era mico. Daquela branca com as tiras azuis. Tiras azuis. Curioso.Em inglês o adjetivo não muda de gênero. E ele vem antes do substantivo, ou seja, nome. Blue straps. Traduzindo ao pé da letra, Azul Tiras. Trabalhava. Isto era certo. Provavelmente era mal pago. Como a maioria. Hoje em dia, Adauto Lima, político respeitado, olha que privilégio! Cheio da grana, virou síndico do prédio. Recebe seu salário de juiz aposentado, como político não tira muita coisa, por conta da honestidade. Está entre os poucos homens de mérito em seu cargo. Todo ano ele troca de carro. Continua com seu bigode, Havaianas não mais. Banheiro ele sabe tratar. Um homem cortês e elegante, rico investidor. Na reunião do condomínio, me disseram. Reduziu a proporção do salário dos empregados com a inflação. Os funcionários reclamavam. Entre quatro paredes, pois poderiam perder seus empregos. O porteiro estava sobrecarregado. O faxineiro era mal pago.

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3 comentários:

Eloise Porto disse...

Blue straps. Ficou sonoro.

Rafael disse...

The sound of straps hitting...

C. disse...

A segunda coisa que o escravo de Brás Cubas comprou foi um escravo. A primeira, alforria.